No último domingo (22 de março de 2020), o Governo Federal editou a Medida Provisória nº 927, a qual flexibiliza algumas normas do Direito do Trabalho durante o período de calamidade pública em razão da pandemia decorrente do novo coronavírus, valendo salientar que sua vigência é limitada ao período que perdurar o estado de calamidade reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, assinado pelo Congresso Nacional.
Devido ao grande impacto econômico nesse período, a Medida Provisória tem como finalidade a proteção ao emprego e, ainda que existam diversos pontos que podem ser alterados pelo Congresso Nacional, é importante que empregados e empregadores tenham conhecimento das disposições desta norma emergencial, uma vez que a sua aplicabilidade é imediata.
Em seu artigo 3º, a Medida Provisória elenca as medidas que poderão ser adotadas para enfrentamento dos efeitos econômicos decorrentes do estado de calamidade pública, quais sejam:
I – o teletrabalho;
II – a antecipação de férias individuais;
III – a concessão de férias coletivas;
IV – o aproveitamento e a antecipação de feriados;
V – o banco de horas;
VI – a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;
VII – o direcionamento do trabalhador para qualificação;
VIII – o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS.
A norma busca ajustar as regras de Direito do Trabalho que abordam exatamente os temas elencados acima, salientando-se que, por meio da Medida Provisória nº 928, publicada em 24/03/2020, foi revogado o trecho que tratava do direcionamento do trabalhador para qualificação e suspensão do contrato de trabalho por até 4 (quatro) meses. Vejamos as principais alterações que permaneceram em vigor, mesmo após a edição da MP nº 927:
1) Teletrabalho
A Medida Provisória estabelece que o empregador poderá, a seu critério, alterar o regime de trabalho do empregado, aprendiz ou estagiário para o de teletrabalho, independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho, devendo o empregado ser avisado, por escrito ou por meio eletrônico, da alteração com antecedência de 48 (quarenta e oito) horas.
O legislador deixou claro que os empregados no regime de teletrabalho não se submeterão ao regime de jornada de trabalho disposto no Capítulo II da CLT, inserindo-se na exceção prevista no artigo 62, III, da norma consolidada. Ou seja, os empregados submetidos a esse regime não terão direito ao recebimento de horas extras.
A Medida prevê, no entanto, a necessidade de formalização por contrato das disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, pela manutenção ou pelo fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho.
2) Férias
A MP 927 reduziu o prazo de aviso das férias para 48 (quarenta e oito) horas, enquanto a CLT exige, no mínimo, 30 (trinta) dias. Destacando-se que o aviso poderá ser feito por meio eletrônico e que o período de férias não poderá ser inferior a 5 (cinco) dias.
O Governo autorizou ainda a antecipação das férias, seja de período aquisitivo incompleto (e.g. empregado que tem apenas seis meses de emprego), neste caso por determinação unilateral do empregador, seja de períodos aquisitivos futuros (e.g. período aquisitivo 2020/2021), nesta última hipótese, entretanto, é necessário firmar acordo individual por escrito.
O pagamento das férias também foi alterado: antes era exigido o pagamento com 2 dias de antecedência ao início do gozo, agora o pagamento das férias poderá ocorrer até o 5º dia útil do mês subsequente (da mesma forma que seria realizado o pagamento do salário caso o empregado estivesse trabalhando), inclusive, o adicional constitucional de 1/3 sobre as férias poderá ser pago até o dia 20/12/2020, data que é devida a segunda parcela do 13º.
3) Férias coletivas
Para as férias coletivas a novidade é que ficam dispensadas as comunicações prévias ao sindicato de classe e ao órgão local do Ministério da Economia, além de ser exigido apenas o prazo de 48 (quarenta e oito) horas de antecedência para o aviso de férias.
4) Da antecipação de feriados
Com a Medida Provisória editada, durante o estado de calamidade pública, os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais, notificando o empregado com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas e indicando quais os feriados serão antecipados.
Desta forma, feriados civis como 21 de abril, 1º de maio, 7 de setembro e 15 de novembro poderão ser antecipados para, posteriormente, serem trabalhados sem pagamento de adicional.
5) Banco de horas
O legislador autorizou a constituição de regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, em favor do empregador ou do empregado, estabelecido por meio de acordo coletivo ou individual formal, para a compensação no prazo de até dezoito meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública.
A compensação de tempo para recuperação do período interrompido poderá ser feita mediante prorrogação de jornada em até duas horas, que não poderá exceder dez horas diárias e poderá ser determinada pelo empregador independentemente de acordo individual ou coletivo.
6) Suspensão de exigências administrativas de saúde e medicina do trabalho
Durante o estado de calamidade pública, as empresas estão desobrigadas de realizarem os exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto os exames demissionais (que igualmente poderá ser dispensado caso o exame médico ocupacional mais recente tenha sido realizado há menos de cento e oitenta dias), bem como não há obrigatoriedade na realização de treinamentos periódicos e eventuais dos atuais empregados, previstos em normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho.
Os exames ocupacionais que deixarem de ser realizados neste período deverão realizados no prazo de sessenta dias, contados da data de encerramento do estado de calamidade pública.
7) Diferimento do pagamento do FGTS
O empregador poderá optar por pagar o FGTS das competências de março, abril e maio de 2020, em até 6 (seis) parcelas mensais, com vencimento no sétimo dia de cada mês, a partir de julho de 2020.
8) Outras medidas
Além das disposições acima, válido se destacar ainda que instituições de saúde poderão interromper as férias dos empregados para convocá-los de volta ao trabalho, e que todas as medidas tomadas até 30 dias antes da publicação da MP 927, que não contrariem suas disposições, estão por ela convalidadas.
Deve-se dizer ainda que o artigo 2º da Medida Provisória atribui ao acordo individual preponderância sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição, de modo que é possível, observados os limites constitucionais, flexibilizar ainda mais a relação de emprego.
Conclusão:
Destacamos que a adoção dessas medidas deverá ser acompanhada por assessoria jurídica qualificada, havendo diversos pontos que poderão trazer riscos caso não sejam corretamente observadas as normas celetistas.
Reiteramos que, ao sinal de qualquer alteração da medida por parte do Governo Federal, divulgaremos.